Ser feliz não é fácil
Gostaria de iniciar afirmando que é fácil ser feliz, mas não é, seria uma falácia, ou até mesmo desumano de minha parte afirmar que ser plenamente feliz é fácil. Sempre que alguém afirma que ser plenamente feliz é fácil, está na verdade fazendo uma maldade enorme, pois que transferem a culpa da não felicidade plena de todos, para cada um de si, que acabam por se acharem incompetentes, ou incapazes por não conseguirem chegar a tal felicidade plena e contínua, e levam a estes o dissabor de não alcançarem, o que na verdade ninguém consegue.
Em verdade creio que a felicidade plena é impossível. Creio que o termo ou o sentido de “ser” feliz deve ser substituído por “estar” feliz. A felicidade é um estado de ser, mas nunca um estado pleno e contínuo. Sinceramente, não acredito em ninguém que se diga plena e continuamente feliz, entendo estas pessoas como mentirosas, ou o que é pior ainda, como alienadas do sofrimento alheio, e da dor dos que lhe cercam. Com isso não quero dizer que o estado padrão seja o do desespero ou o da infelicidade, não foi isto que eu falei. O que eu quero dizer é que a felicidade é um estado de altos e baixos, horas estou feliz, outras horas muito feliz, outras mais estou triste, e talvez a maioria do tempo estou em algum estado neutro quanto a felicidade ou a infelicidade. Sendo de novo verdadeiro comigo mesmo, acho que aos poucos conseguimos superar o estado de infelicidade, poderemos chegar a um estado em que a infelicidade passe a ser algo ausente, mas jamais superaremos, se formos humanos de verdade, o estado de tristeza. Entendo que podemos estar tristes sem sermos infelizes necessariamente, ou sem entrarmos em desespero profundo. Agora, reforço meu entendimento que jamais estaremos livres de sentirmos tristeza.
Como não ficar triste quando perdemos um filho, um amor de nossa vida, um amigo profundo? Como não ficar triste se nosso lar desaba ou pega fogo? Como não ficar triste, com uma doença incurável? Como não ficar triste quando alguém que amamos sofre um acidente? Vocês podem perceber que ainda estou apenas falando de nós mesmos, e dos nossos, mas a vida, o viver, a realidade existencial, está muito além de nós mesmos e dos nossos. Como não sofrer alguma tristeza com as guerras? Como não sofrer com estupros, em especial de crianças? Como não sofrer com um filho, de quem quer que seja, que nasça doente ou com alguma má formação congênita? Como não ficar triste com um aborto natural de um filho desejado? Como não sofrer com a miséria, com a fome, com a dor, com a exclusão, com a opressão, e com a exploração, de irmãos em espécie, e de novo piorada quando envolve diretamente crianças? Como não sofrer com o sofrimento ou a dor dos outros? Como não sofrer com eventos naturais, geológicos, climáticos, que matam, e jogam ao sofrimento todo um grupo de irmãos, por terremotos, furacões, tempestades, secas, deslizamentos, tsunamis, erupções poderosas de vulcões, entre outros? Como não sofrer quando uma empresa quebra? Como não sofrer com atos sem sentido, de fundo político ou religioso, que levam a atentados e a atos de terror? Como não sofrer quando você percebe pessoas ou instituições, preocupadas com eles mesmos, se “lixando” para os que tenham que sofrer pelos seus interesses? São tantas as causas que nos levam a algum sofrimento ou tristeza que não adianta continuar, mas o que me interessa aqui é dizer que se alguém é plena e continuamente feliz, com tudo isto ao seu redor, ou é mentiroso (o que eu prefiro crer), ou é um alienado da realidade em que vive, ou então é desumano, na essência de seu ser. Agora, a vida também nos traz motivos de felicidade e alegria. Assim nossa vida é um contínuo flutuar entre momentos mais alegres e felizes, e outros mais sofridos e tristes. A notícia da gravidez, o nascimento de um filho saudável, a formatura de um filho, nosso casamento, o casamento de um filho ou de um amigo, a felicidade de um filho, de alguém que amamos, ou mesmo de um simples colega, o sorriso natural de uma criança, a notícia da cura de uma doença grave, e outras tantas boas notícias conosco, com quem amamos, com nossos amigos, ou mesmo com estranhos, nos trazem alegria e felicidade. Assim, boas e más situações se sucedem e, no geral, na média, nossa vida é pontilhada com momentos alegres e outros tristes, com felicidades e com algum sofrimento, mas podemos sim, conseguir um estado tal de amor e paz de espírito, em que mesmo nos momentos tristes e de algum sofrimento, consigamos viver sem desespero, sem infelicidade, principalmente se superarmos a esperança, por uma vida em desesperança, nunca desesperada, uma vida em que não esperamos nada dela, vivemos, construímos, aceitamos o que temos, e o que vier será motivo de regozijo e felicidade.
Eu sei que falar é muito mais fácil do que fazer, mas entendo ser possível viver o mais longe possível da infelicidade e do desespero, realizando um contínuo entre alguma felicidade e alguma tristeza, pelo menos para a maioria das pessoas, que não vivem em miséria, que não vivem sem uma perspectiva mínima de dignidade humana, que não vivem abandonadas pela sociedade, pelo estado, ou excluídas socialmente. Para a maioria absoluta de nós, reafirmo minha sincera crença de que entendo que podemos viver sem desespero e sem infelicidade, flutuando entre momentos mais ou menos felizes, entre momentos de algum sofrer e momentos de alguma alegria.
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