Superstições
Durante muito tempo, por um erro clássico de interpretação, considerava como sobrenatural somente falsos episódios
ou ocorrências ligados de alguma forma, diretamente, a eventos “religiosos ou místicos”, como se sobrenaturais fossem somente situações relacionadas a um ou vários deuses, espíritos, milagres, fantasmas ou zumbis, forças “astrais” ou “celestes”, de origem transcendental, mas sempre ocultas ao nosso dia a dia, e acabava assim não percebendo que o conceito de sobrenatural é muito mais amplo, é muito mais etéreo ainda, e que pode em muitos casos decorrer e se enraizar nas fendas de nossos desejos, crenças, e na pseudo sensibilidade, uma espécie de “supersensibilidade” ou “supersentido”, que acreditamos poder possuir para perceber padrões capazes de justificar uma série de superstições, crendices e preconceitos.
Superstição e sobrenaturalidade podem “contaminar” tanto místicos e religiosos, como mesmo seculares. Quantas pessoas não místicas ou religiosas acabam acreditando, ou mesmo fazendo atos “nonsenses”, no sentido da realidade que vivemos, por consciente ou inconscientemente acreditarem que tais atos, a grande maioria deles individuais, possam nos ajudar, possam nos indicar melhores caminhos, ou nos levar mais perto da sorte ou para mais longe do azar. Mais do que isto, pessoas de boa cultura, com inteligência média ou superiores são tão capazes de cair nesta tentação, como pessoas mais incultas ou de menor poder intelectual. O sobrenatural povoa nossas mentes como algo possível, cabe a cada um de nós discernir quando estamos sendo naturalmente iludidos, nos tornando sensíveis ao que não existe e ao que não faz sentido algum existir.
O próprio conceito de “sorte ou de azar” já é uma superstição. Quantos humanos que vaidosa, grosseira, pretensiosa e presunçosamente se arvoram em se afirmarem céticos, incrédulos, materialistas ou ateístas e acabam embarcando em crendices supersticiosas e em comportamentos sobrenaturais, como se algum poder pudesse existir por detrás daqueles atos. Alguns exemplos como, vestir a mesma roupa por que acreditamos que “deu sorte” ou que nos “dará sorte”, não vestir a mesma roupa que “deu azar” no passado, não passar por baixo de escadas, evitar cortar o caminho de gatos pretos, bater três vezes na madeira, repetir mantras, carregar amuletos e patuás, além de muitas outras atitudes supersticiosas que necessitam forçosamente, mesmo que finjamos não ser verdade, ter por trás de si toda uma estrutura de sobrenatural, posto que sozinhas, tais atitudes, em nada afetariam o presente que se descortina continuamente.
Até mesmo o desconforto de tocar objetos utilizados por marginais ou criminosos é uma superstição, uma vez que estes objetos, ou outros quaisquer, não fazem o ser, é sim o ser quem faz uso destes objetos.
Se tocar em objetos utilizados por malfeitores me trouxesse azar ou fizesse por si só aflorar meu ódio ou meu desespero, coitado dos policiais e médicos que necessitam tocar não só nos objetos como nos próprios criminosos em si, pior ainda o caso dos médicos que muitas vezes terão contato direto com o sangue e as entranhas destes marginais.
É lógico que evitar possuir tais objetos se deva tão-somente para evitar as lembranças que eles podem acarretar em nossa mente. Entendo como normal e salutar evitar objetos e imagens que nos fazem rever ou revisitar momentos difíceis. Por outro lado, em havendo necessidade de tocar tais objetos, movê-los, guardá-los, limpá-los ou destruí-los, não pode haver medo, receio ou superstição que nos afaste de fazê-lo.
Desta forma, acabei ao longo do tempo entendendo que eram fraquezas do meu pensar e que quanto mais as fazia, mais enraizadas em mim ficavam estas atitudes supersticiosas, e assim eu caminhava, lado a lado com este sobrenatural, apenas destacado das religiões, seitas e grupos estruturados. Despir-me disto tudo foi premente, mas somente foi possível quanto mais eu me incluía entre os que possuem algum conhecimento científico. A ciência, o racionalismo, o livre pensar, uma postura cética e crítica, são em si a melhor forma de quebrar qualquer ligação mental com aquela espécie de virose mental que nos tenta ligar com o sobrenatural e as superstições, pois que passamos a entender o quão sem sentido elas são, a não ser algum efeito residual interno a nossa mente que pode em alguns casos nos dar mais coragem e ousadia de tentar as coisas, mas esta coragem e ousadia pode ser conseguida pela elevação de nossa autoestima, de nosso preparo físico e intelectual, sem todos os demais riscos e inutilidades do sobrenatural e das superstições.
Ser livre é saber que não existem carma, destino, e nada do tipo, eles são somente uma reação natural dos atos pregressos que praticamos, e mesmo assim uma reação parcial posto que somos direta e indiretamente impactados por uma série de reações e eventos que sequer conhecemos ou tenhamos chegado perto. A complexidade do viver é tal que emerge continuamente uma sucessão de fatos, acontecimentos e imprevistos que não possuem diretamente nenhuma causação com nossa realização do viver.
Ser livre é também não temer o irreal, é buscar a verdade no seu foco central, é ser capaz de perceber que apesar da verdade ser única, ela é percebida de diversas formas e assim devemos ter a coragem de buscá-la em todas as suas formas possíveis, buscando assim uma interpretação sempre o mais global possível desta verdade que buscamos. Devemos ter a certeza que o sobrenatural, superstições e preconceitos, não mudam a realidade, por isto não devemos perder tempo com eles, e sim na construção do nosso humano e social viver.
Sempre que nossas crenças ou comportamentos nos levam a ações nas quais a naturalidade de nossa existência fica forçosamente relegada a forças ocultas ou sem respaldo natural, científico, racional, lógico, ou crítico, estamos embarcando numa realização sobrenatural do viver. Assim devemos ter atenção redobrada com estes atos supersticiosos, se não desejarmos ser chamados de crentes no sobrenatural, buscando sempre separar o que faz sentido do que sentido nenhum faz...
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Sou um ateu racional e um livre pensador, ou melhor, eu sou um ateu que tenta ser (que se compromete a ser) racional e livre pensador.
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