Gráficos, uma esquecida criação e seu uso no reinício quantitativo de nossa ciência


“Sempre achei estranho que muitas pessoas saibam quem inventou o Cálculo Infinitesimal (maiúscula propositalmente pelo respeito que tenho ao cálculo, ferramenta principal do grande salto científico), embora poucas saibam usá-lo, enquanto poucas pessoas sabem quem inventou o Gráfico, ainda que praticamente todo mundo o utilize. Leonard Mlodinov”.

A matemática é a forma como a física ganha representação, e mais do que isto, a matemática é uma das ferramentas de estudo, análise e entendimento da realidade física, é também uma forma de refutação, comprovação e estudo dos desdobramentos possíveis, desta forma é a matemática a linguagem natural da física. Quando “falta” matemática, é necessário que ela seja desenvolvida, construída e modelada para que o físico seja capaz de falar e representar sua física, e mais importante ainda raciocinar sobre a realidade desta física em que está trabalhando. O gráfico foi desenvolvido (criado) a muito e muito tempo atrás, quando a álgebra não tinha sido ainda aprofundada. Vou comentar sobre o que se acredita ser o primeiro uso formal do gráfico em uma das primeiras modelagens quantitativas, da ciência física, enquanto ela ainda adormecia no longo e tenebroso inverno intelectual por que passamos. Gostaria de comentar que qualquer estudante médio de hoje, sabe muito mais matemática do que qualquer cientista avançado (ou o que vulgarmente chamamos de cientistas), sabiam no século XIV. Os primeiros passos na física, nas primeiras tentativas de resgatar o que poderia ser ciência quantitativa, ocorreu no estudo do movimento, talvez por ser prático, e seriam leis fundamentais aplicáveis a toda e qualquer matéria, como já era especulado por alguns atomistas já na antiga Grécia. Havemos também de lembrar que para o estudo profundo do movimento é necessário uma forma de medição minimamente precisa do tempo, e não havia nada parecido na história da época medieval. Os relógios de sol, não tinham precisão alguma, eram simples formas de distribuir o tempo diurno. Como muitos sabemos a passagem física do sol, é diferente dependendo da época do ano. O tempo para aquele pessoal era entendido bem diferentemente do que hoje entendemos. Falamos de uma época por volta do ano 1325 a 1360. Cabe comentar quanto a dificuldade de uma medição temporal com alguma precisão, que a divisão solar de horas era muito elástica, dependendo da época do ano, e como exemplo, uma “hora” naquela medição podia variar de algo entre 38 minutos a 82 minutos, isto não incomodava ninguém, mas dava uma interpretação elástica ao tempo, e é uma prova de que as pessoas naquela época só precisavam de uma noção vaga e qualitativa do tempo, e não de uma precisão materialista quantitativa deste mesmo tempo.


Pela primeira vez, estudiosos do Merlon College intuíram leis básicas que vieram a ser o palco natural para o crescente florescimento, se bem que no início, em velocidade muitíssimo lenta, para o boom científico. O mais especial era o retorno à física quantitativa, que absolutamente mais nada tinha a ver com as ideias de propósito ou de projeto, que limitavam toda e qualquer visão séria cientifica, por muitos séculos. Retornando aos estudiosos do Merlon, cabe então dar mais valor ainda ao seu progresso, e com toda esta dificuldade eles chegaram a uma definição brilhante, para aquele momento, sendo a primeira regra quantitativa do movimento, de todos os tempos: “a distância percorrida por um objeto que partindo do repouso, possui uma aceleração constante, é igual a distância percorrida por outro objeto, que se movimentando no mesmo tempo, mas com a metade da velocidade máxima alcançada pelo primeiro objeto naquele mesmo espaço de tempo.” A definição da lei em si, pode não ser exatamente igual a esta que eu escrevi, não me lembro exatamente das palavras, mas com certeza ela refletia o sentido anterior. Mas eles tinham que conseguir alguma prova disto. A álgebra robusta e a física do movimento não existiam. E eles, a quem me curvo, brilhantemente criaram um conceito matemático que serviria de prova, o gráfico, e que passaria a nunca mais abandonar a física, a ciência, e mesmo nossas vidas. Hoje saber ler e interpretar um gráfico é algo que todos devem conceitualmente saber fazer bem, pois que o gráfico é uma ferramenta simples, mas que fala muito. O que fizeram aqueles pensadores, que ousavam largar de mão a forma “simplória e errada” cientificamente de pensar? Cabe lembrar que a álgebra, ou o cálculo ainda não eram ferramentas de uso comum, o Cálculo, sequer existia. De forma brilhante, Oresme, para provar a nova “lei”, se não a primeira, uma das primeiras “leis” físicas, e com certeza a primeira relativa ao movimento, desenhou um gráfico (ou o que poderia ser hoje feito em um gráfico) VxT (velocidade no tempo), em que a linha horizontal era o tempo medido a partir do tempo zero, e a linha vertical era a velocidade também medida a partir da velocidade zero. Não eram propriamente os eixos x e y tão tradicionais, apenas duas linhas, formando um ângulo de 90 graus, com um início coincidente, que era o ponto de velocidade e tempos iguais a zero. O que fez o grande e esquecido Oresme, desenhou duas retas, uma com uma inclinação maior que 0 (zero) graus e menor que 90 graus, na verdade ele fez uma com 45 graus (mas a prova seria a mesma qualquer que fosse a angulação, pois que esta demonstraria apenas a aceleração, e em sua lei quantitativa, a única necessidade é que a aceleração fosse constante, assim sendo uma reta, e que tivesse início nos tempos e velocidades zero. Ele “hachurou” esta área. A seguir, na linha vertical da velocidade, identificou o ponto médio (metade da velocidade máxima) e traçou uma linha horizontal e “hachurou” diferentemente esta área. O que faltava? Apenas provar que as áreas eram as mesmas, o que por geometria era bem fácil. Brilhante, simples, mas de uma revolução incrível na forma de livre pensar, resgatando a “mensuração” para a ciência, que havia iniciado na época pré-socrática, mas que foi forçosamente esquecida pelos que detinham o poder. Sempre que me lembro desta história, sinto orgulho do que uma mente livre, séria, e focada, pode fazer e alcançar, mesmo que quase nada ao seu dispor possua para perceber, ler, entender e compreender a natureza e a realidade material deste mundo. Oresme, e pensadores do Merton, vocês foram demais, eu respeito pacas vocês (em algum novo texto falarei da importância para a ciência, da criação das universidades, que no início nada tinham a ver com nosso conceito de universidades, mas que tiraram dos templos e das igrejas (no início dividiram, mas aos poucos tiraram para si), o poder intelectual de pensar, estudar, e crescer, passando a ser cada vez mais o centro intelectual que permitiu o progresso da ciência). Com o tempo, aos poucos, este processo, esta forma de pensar e de modelar quantitativamente a realidade passou a dominar, e assim foi cada vez mais minando a “propriedade” da verdade como detida unicamente pela igreja, e em contraposição as “verdades” REVELADAS pela bíblia, nas escrituras sagradas, e na tradição da igreja, passando a dar luz a uma nova fonte de verdades que podia ser descoberta diretamente da natureza. A verdade passa a ter origem na natureza e no uso de ferramentas matemáticas para seu desenvolvimento. 


OBS acrescentado apenas para fins de algum, não perfeito e nem definitivo, posicionamento histórico:
A fase antiga da álgebra (elementar), que abrange o período de 1700 a.C. a 1700 d.C., aproximadamente, caracterizou-se pela invenção gradual do simbolismo e pela resolução de equações (em geral coeficientes numéricos) por vários métodos, apresentando progressos pouco importantes até a resolução "geral" das equações cúbicas e quárticas e o inspirado tratamento das equações polinomiais em geral feito por François Viète, também conhecido por Vieta (1540-1603).

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