Não sou plenamente infeliz, e não consigo acreditar em quem se diz plenamente feliz

Não confio em pessoas que se vangloriam afirmando serem absolutamente felizes, como não confio em quem se auto intitula sábio, com isto não quero dizer que somos todos absolutamente infelizes, como também não quero afirmar que para acreditar ou confiar em alguém é necessário que este alguém esteja em pleno “gozo” de seu sofrimento absoluto ou de sua infelicidade incondicional. Muitas são as vezes que ao expressar minha desconfiança naqueles que se assumam absolutamente felizes, sou interrompido por assertivas do tipo: “Não generalize a sua própria infelicidade. Se você é incompetente para ser feliz, não significa que os outros não possam ser felizes”, outras vezes ouço que a minha infelicidade é o preço pago por não aceitar jesus, e que sem deus no coração, serei realmente um eterno sofredor, um ser incapaz de amar e de encontrar a felicidade humana.


Normalmente sorrio, não como forma de provocação, mas como forma de tentar minimizar o mal estar. Para começar nunca falei que era um infeliz, falo e repito que prefiro ser um infeliz a ser um feliz hipócrita, um feliz alienado, um feliz com todo o sofrimento de milhões de irmãos.  Não creio, não consigo crer naqueles que se dizem completamente realizados e felizes por várias razões, mas destacaria: Ou ele é mentiroso, fala sem o ser, fala sem pensar no sofrimento do outros, ou pior ainda ele é um insensível, um desumano ou um irresponsável por não ter empatia com os irmãos que sofrem, e que são aos milhões, ou talvez porque ele seja um alienado do mundo, vivendo somente sua mesquinha existência, se abstendo de simplesmente levantar os olhos e ver a miséria, a exclusão, a opressão e os preconceitos que estão incrustados em nossa sociedade. 

É certo que realizando um viver normal, humano, na média, tenho momentos felizes e momentos infelizes, alguns momentos sofro e outros regozijo em alegria. Ser feliz então é uma questão de momento (não sou feliz, mas estou feliz), buscar a felicidade é buscar minimizar o sofrimento e a infelicidade e maximizar o potencial e a frequência de momentos felizes em nosso viver. Como não ser infeliz quando se perde um filho, quando o vê sofrer, quando o vê caminhar por estradas desumanas, como não sofrer quando se perde a esposa amada, um amigo. Como não sofrer quando se vê crianças abandonadas, com fome, excluídas socialmente. Como não sofrer quando se vê a opressão contra negros e mulheres. Como não sofrer quando se vê o preconceito de cor, de gênero, de opção sexual, de religião e outros. Como não sofrer quando se vê pobres sem conseguir tratamento médico, moradia digna, segurança, justiça e boa educação. É impossível ficar alheio a isto. É impossível se manter insensível, se manter afastado da revolta contra o que aqui está, se alguém consegue, prefiro não confiar nele. Em contra partida como não ser feliz com o nascimento de um filho saudável. Como não ser feliz com um bom emprego, com a formatura de seu filho, com o casamento dele, com o nascimento de um neto. Como não ser feliz quando se vê um opressor sendo enquadrado pela justiça. Assim vivo e entendo que pessoas humanas normais e saudáveis vivam nesta sucessão de momentos felizes e infelizes, e somente uma dedicação séria, uma doação de si mesmo por uma transformação social pode minimizar os momentos de sofrimento. 

Tenho sincera pena e medo daqueles que se escondem por traz de alguma ou de qualquer coisa (natural ou transcendental) para justificar suas felicidades absolutas.


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