Conhecimento e ignorância

Quanto mais conheço, mais ignoro, e em contrapartida quanto mais percebo que ignoro, mais eu conheço. Incoerência? Contradição? Não claro que não. Talvez possa parecer contrassenso, entretanto, na vastidão praticamente infinita do que seja possível conhecer, conhecemos apenas parte, e mesmo assim uma parte pequena, e este mesmo conhecimento pode muitas vezes ser incompleto, frágil ou imperfeito e inacabado. A linha limítrofe entre o conhecido e desconhecido, em nada se parece com uma linha, e sim com um, muitas vezes terrível pântano que se inicia, do lado do conhecimento com poças e penhascos, mas que termina, do outro lado, do desconhecido, como algo que nos assusta pelo que não podemos ver, conhecer ou alcançar. O conhecimento pode ser pictoricamente imaginado como uma espécie de ilha, de mar, ou de lago, onde a porção interior é o que de alguma forma se conhece, e o externo toda aquela imensidão do desconhecido. Desta forma existe, uma área, disforme, “litorânea” que envolve a nossa imaginada ilha, ou lago, ou mar, contornando-os, separando-os e que tende a crescer, sempre e cada vez que novos saberes, novos conhecimentos, são conseguidos, fazendo com que a nossa imaginada e hipotética ilha do conhecimento, o mar de conhecimentos, e o lago do conhecer, cresçam continuamente, e em paralelo cresce também aquele perímetro que circunda nosso conhecimento. Desta forma, fica, para mim, fácil admitir que quanto mais conheço, quanto mais sei algo, mais SEI que desconheço, pois que maior é o perímetro total.

Conhecemos em totalidade muito, cada um uma parte, uns mais, outros menos. Cada vez mais conhecemos muito mais. Não falo de meu conhecimento pessoal, me referencio ao conhecimento coletivo. A curva do conhecimento cresce em proporções exponenciais. Nunca soubemos tanto, e nunca imaginávamos que o conhecimento fosse capaz de avançar tanto e em tamanha velocidade. E olha que me refiro tão somente ao conhecimento científico ou natural, envolvendo todo e qualquer ramo científico, histórico, natural, seja ele positivo (aquele que cremos saber como ativo) ou mesmo todo e qualquer conhecimento revelado por refutação (aquele conhecimento em que cremos ter conhecimento da verdade refutada, ou seja, dos erros conhecidos, posto que conhecer o errado ou o refutado também é conhecer, e de alguma forma nos faz chegar um pouco mais perto do conhecimento positivo, pois que jogamos fora uma parte do desconhecido, pela impossibilidade).


Ignoramos muito. Cada vez mais percebemos que ignoramos muito mais coisas. O desconhecimento limita até a possibilidade de conhecer o quanto ignoramos, pois que ficamos sem referencial, então quando cresce o conhecimento, cresce junto o conhecimento que cada vez desconhecemos muitas coisas. O universo do que cremos ignorar é cada vez maior. Não falo de minha ignorância pessoal, me referencio a ignorância coletiva e social. A curva da ignorância cresce em proporções exponenciais. Nunca ignoramos tanto, e nunca imaginávamos que o desconhecido sobre o qual temos consciência de nossa ignorância fosse capaz de avançar tanto e em tamanha velocidade. E olha que me referencio tão somente a ignorância cientifica, histórica, ou natural, aquela ignorância sobre a qual possuímos crença consciente de que deve existir algo que eu desconheço, não me refiro aquela abstração de que ignoramos tudo e qualquer coisa que sequer temos referência para ignorar, me foco tão somente na ignorância de algo sobre a qual tenho competência para perceber que algo está errado e que ignoro o porquê, uma vez que determinado fato não se adere ao meu conhecimento positivo, a realidade que de alguma forma percebemos, ou mesmo sobre o qual não consigo refutação concreta.

A princípio podem parecer incoerentes entre si minhas duas assertivas acima: Cada vez conhecemos mais, e cada vez mais ignoramos. Eu só posso ter a ideia de que ignoro e desconheço algo, quando tenho a consciência ou a crença que algo conheço. Se nada sei, tudo desconheço, pois que não possuo referência de verdade para validar minha ignorância, se não ignoro, não possuo a curiosidade e a capacidade de conhecer. Conhecer e ignorar não são antônimos diretos, pelo menos não no sentido que desejo colocar. O antônimo natural de conhecer é desconhecer, no sentido deste texto, e desconhecer não é sinônimo direto de ignorar. Ignorar não significa ignorar o infinito, o absurdo, o desconhecido absoluto. Desconheço tudo aquilo que não conheço, mas para ignorar necessito algum referencial de conhecimento. Somente posso ignorar quando deveria conhecer, tenho indícios lógicos, críticos e racionais para que algo eu conhecesse, mas ignoro sua lógica direta ou subjacente, ignoro suas leis, ignoro sua realidade, ignoro inclusive como refutar o que deveria conhecer e como provar experimentalmente ou teoricamente o que deveria conhecer. Tenho indícios, não desconheço assim totalmente, mas ignoro suas leis, suas teorias, sua imanência, e finalmente ignoro sua verdade imanente que somente adquirirei quando refutar absolutamente, mas não possuo competência para tal.

Apenas para reforçar a imagem que tenho do conhecimento como uma ilha. Reforçarei uma analogia fictícia, voltando a tentar demonstrar o porquê entendo que mesmo sempre mais conhecendo, mais ignoramos também.

Retornando a imagem de uma pequena ilha cercada e um oceano absurdamente enorme a sua volta. Uma ilha incrustada numa infinidade de mar absoluto. A ilha seria o conhecimento. A ilha faz fronteiras com o mar, e seu perímetro fronteiriço com o mar serve de divisão entre a ilha e o mar. Mesmo assim esta divisão não se dá, normalmente, tranquilamente, de forma brusca, existe a praia, desde uma tranquila e rasa praia, até uma revoltosa e turbulenta praia, existe ainda o platô continental submerso que costeia toda a ilha e finalmente o mar aberto e profundo. Gostaria de convencê-los a uma abstração de simples percepção. Percebamos esta ilha como o conhecimento, e o mar como um “mix” inicial de nosso ignorar e depois do desconhecido mar aberto e profundo. Ainda de boa-fé percebamos a ilha como uma ilha vulcânica, em constante crescimento, com terrenos acidentados, com areia movediça e tudo o mais, e sofrendo de constante turbulência geofísica, pois enormes vulcões lançam continuamente novos saberes e fazem a nossa ilha do conhecimento crescer e se renovar, muitas vezes à custa de traumáticas mudanças. Internamente, a ilha do saber sofre sucessivas transformações em seu solo (o conhecimento), e a superfície da ilha não para de crescer, pois as lavas de saberes são continuamente despejadas trazendo consigo revoluções de conhecimento, e novos saberes. A fronteira de nossa ilha com o mar do desconhecido dá início a área de nosso ignorar. Esta fronteira entre o conhecer de nossa ilha e o desconhecido absoluto do mar aberto é preenchida por áreas de ignorância que são as praias (calmas ou hostis) e a plataforma continental que rodeia nossa ilha, e assim, em uma espécie de degrade do conhecimento, vamos do solo firme do saber ao mais profundo mar aberto do desconhecido passando por indeléveis tonalidades do ignorar.

Como o conhecimento seria como uma ilha vulcânica, ela cresce continuamente, e assim cresce o conhecimento, mas com este crescimento contínuo, cresce também o perímetro natural de nosso saber e assim a área de contato com nossa ignorância cresce junto. Maior área de nossa ilha significa maior perímetro total, e assim maior área de transição (margem flutuante) entre o que conhecemos e o que desconhecemos.

Espero que assim tenha conseguido me fazer entender quando sinceramente defendo a tese de que quanto mais conhecemos, mais também ignoramos.


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