Pensar e saber pensar.

Pensar e “saber” pensar.

Pensar e “saber” pensar! Existe algum pensar bem em contraposição a um pensar mal? Existe alguma forma certa de pensar em contraposição a alguma forma errada de pensar? Realmente pensamos, ou reagimos apenas a impulsos e realizamos processos apenas autônomos? Processos autônomos de pensar (funcionalidades “zumbis” basicamente autônomas, que desconhecemos totalmente, que operam no nível bioquímico, físico (digital e analógico) do circuito cerebral) seriam pensar? Pensar bem é possível? Pensar bem é uma arte natural? É uma técnica? É um princípio natural? É possível aprender a pensar bem? É possível desenvolver o bem pensar, ou o costume de bem pensar? Pensar bem ou mal seriam alguma qualidade do ato de pensar, ou simplesmente pensamos, e a forma como utilizamos esta funcionalidade é que pode nos parecer pensar bem ou pensar mal? Seria possível ser realmente independente e livre de tudo no pensar sobre um assunto, qualquer assunto, ou sempre estaremos, em algum grau, envolvidos emocional e sentimentalmente pelo que somos, pelos nossos valores, pelos nossos conceitos, por falhas de processamento, e por induções mil? Talvez não exista o pensar bem ou mal, talvez sim o pensar sobre verdades ou mentiras, sobre fatos ou suposições, sobre casos ou ilusões, sobre desejos ou sobre realidades, sobre vontade ou saberes, sobre evidências e experimentos ou pensar sobre achismos ou catequeses? Entendo que tudo isto dependa muito do que entendemos como pensar. Infelizmente não existem formas concretas de acompanhar e estudar toda a real história do desenvolvimento deste órgão imensamente complexo, assim não podemos ter certeza absoluta de cada passo evolutivo trilhado, que outras variações puderam ter sido “tentadas/experimentadas” pela natureza, mas que de alguma forma possam ter tido um fim, e hoje não a conhecemos. 


Apenas de forma inicial, a posterior tentarei entrar em mais detalhes, percebo que para muitos (não para mim, ou melhor não exatamente, só isto, para mim) pensar seria aquilo que fazemos no domínio consciente, aquilo que tenho consciência de que estou fazendo; para outros (e neste caso estou totalmente excluído destes) o pensar pode parecer horas como um mix de algo físico com “percepções” de algo que acontece exteriormente (uma espécie de captura de rádio), e para outros mais o pensar seria somente capturar algo que universalmente pensa por todos, como se o universo fosse em si a fonte e a origem dos pensares, nos tornando meros receptores de algum pensamento e consciência universal (se eu já estava fora do grupo anterior, deste então, entendo ser impossível que eu participe). Perfeito! Para mim, o que seria então este tal de pensar? Pessoalmente tenho verdadeira restrição ao conceito comum, vulgar no bom sentido, e popular, do que seja ser consciente, entendo que somos basicamente seres inconscientes, entretanto autônomos, responsáveis pelo que somos e pelo que fazemos ou deixamos de fazer quando fazer se fazia premente e necessário, mas, que faz da consciência algo mais simples, assim como apenas uma forma muito bem processada e estruturada de me fazer parecer no comando, algo como um noticiário que fica continuamente, enquanto desperto, e enquanto dono de uma saúde mental média, mínima mas atuante, me mandando “News”, uma atrás da outra. OK! Mas isto ainda não respondeu o que eu entendo como pensar. Sim, é verdade, mas já fala por si só muito do que penso o que possa ser pensar. No mínimo, pensar é muito mais, vai muito mais longe e profundo do que unicamente qualquer possibilidade de pensar unicamente consciente, no mínimo, entendo que pensar é muito mais algo que ocorre subjetivamente, no mundo inconsciente de nosso ser, nos bastidores de muitas partes de nosso circuito cerebral, no submundo de nossas entranhas mentais, muitas vezes, a maioria absoluta delas, entendo, muito longe de qualquer possibilidade de consciência de que estamos pensando. Entendo que pensar sejam processos mentais, que emergem inconscientemente de processos neurais “zumbis”, processando continuamente, e que este mesmo processo é fortemente influenciado pelo próprio feedback do que ele mesmo esteja pensando e do que sensores, tanto internamente, sentindo nossas emoções e nossos sentimentos, quanto também externamente, sentindo as reações dos demais, da própria realidade do que está acontecendo enquanto pensamos. Pensar para mim, é um complexo leque de processos zumbis, talvez com alguns processos mais aparentes, processando em paralelo, de forma bastante distribuída, que buscam “alternativas, respostas, coerência, sequência, ideias, ou conceitos”, talvez muito mais do que isto, pois que me faltem palavras para expressar. Muitos processos têm início ao mesmo tempo, alguns podem dar início a outros, e buscam “mesmas” respostas por meios processuais diferentes, constroem histórias que fazem sentido, analisam e buscam compreensão do todo, que de alguma forma são coordenados por uma espécie de maestro que ao receber cada uma das múltiplas “respostas” acaba por selecionar uma, ou algumas, que as torna em algum instante consciente. Assim, pensar é algo natural, e esta é uma das primeiras respostas que entendo do que seja pensar. Todos pensamos, e segundo minha forma de ver, muitos animais pensam, mesmo que ainda independente de alguma linguagem complexa, mas podem eles pensar por imagens (como nós mesmos o fazemos várias vezes), e por “lógica” natural de pensamento. Erra aquele que pensa que nossa mente, nosso cérebro, processa parecido com um computador. Não processamos top down, não processamos “estruturadamente” segundo uma lógica estruturada de programação, e sim baseado em uma forma estrutural aparentemente desorganizada, mas conforme forte poder computacional biológico. Mesmo o processo distribuído e descentralizado ocorre diferentemente do que ocorre em um processo distribuído e descentralizado de uma rede de computadores. A estrutura neural de nosso circuito é pessoal nos detalhes, sendo a minha rede diferente da de qualquer outro ser humano. Apesar de termos uma estrutura básica em nossa rede, baseada em nosso genoma, a rede final de cada um de nós é única, assim, pode ser que pensemos, cada um de nós, nos detalhes, diferentemente. Entendo eu que até o pensar, excetuando-se todos os processos funcionais “cerebrais” que dão suporte e sustentação direta a nossa vida, ao equilíbrio biológico de todo o ser, e as condições diretas de viver, que são bem programadas, e que tem início de funcionamento e operação muito cedo no processo de desenvolvimento uterino, todo o resto, para mim, já passa por um processo de aprendizado, e com o pensar não é diferente, muito parecido com a linguagem, que não nascemos com ela, mas nascemos muito bem preparados para adquirir uma bem cedo, o pensar seria da mesma forma, algo que não nascemos exatamente com ele, mas que em decorrência de nossos circuitos e “sub-circuitos” neurais, nascemos bem preparados para aprender continuamente o pensar. Isto responde a outra de minhas perguntas, sim podemos aprender sempre a pensar, podemos desenvolver esta funcionalidade a extremos, e o conhecimento, a instrução, pode possibilitar novos e novos processos zumbis que passam a operar funcionalmente em paralelo, dando assim novas alternativas, novas perspectivas, novas respostas em nosso complexo ato de pensar. Mas cada um tem seu circuito próprio, e cada um pode pensar (pode ter um processamento cerebral) diferente. Primeiro porque o circuito neural (erradamente visualizado como algo parecido com o circuito eletrônico de um computador) é por si só variável, ligações são constantemente refeitas, umas criadas, outras reforçadas, outras enfraquecidas, outras desligadas, mas muito mais do que isto, neurônios morrem em volume enorme, alguns novos surgem, e o processamento em si, além de ter sua vertente “digital” (aquele que se dá pelas ligações e pelos neurotransmissores diretamente), ocorre também de forma analógica, por efeito eletromagnético de campo, pois que existem verdadeiros feixes onde passam uma infinidade de neurônios, que com o movimento elétrico cria campos que agem por imantação, como que agentes de informação ou de “feedback” sobre os neurônios mais próximos destes feixes, além de que informações químicas também atuam a certas distâncias afetando e modificando o processamento cerebral, e mais do que isto, nosso processamento mental, está constantemente sendo afetado por feedbacks internos e externos, como ancoragem, indução, moda, vontade de pertencer a um grupo, vergonha, além das quantidades e distribuição dos neurotransmissores, e as vezes de simples vitaminas, e etc., o que jamais afeta um processamento comum de computador. 

Desta forma entendo claramente que nosso circuito cerebral é algo que por si só possui complexidade tal, que seu estudo ainda apenas engatinha. Sendo uma ciência nova, a neurociência já caminhou bastante, entretanto este bastante ainda é muito pouco, frente ao que possa ser o todo potencial de nosso cérebro. E mesmo deste pouco que aprendemos, boa parte deste aprendizado ainda se localiza sobre terreno arenoso, frágil, pantanoso, lamacento, estando ele, o conhecimento, sujeito a erros, portanto sujeito a correções e a ajustes. Aos poucos temos uma imagem básica do cérebro, do pensar, da consciência, do sentir, do se emocionar, do processar, do ver, do ouvir e por aí vai. É como se estivéssemos construindo um mapa de uma ilha, e nosso atual conhecimento já nos permitisse mapear algum contorno litorâneo desta mesma ilha, onde já podemos olhar um pouco à frente, mas apenas na parte sobre o mar, e mesmo assim em locais onde o clima ajude. Desconhecemos ainda as forças das marés, desconhecemos muito do que está sob o nível superior do mar, desconhecemos a estrutura do solo, da água, da vida marinha, das correntes oceânicas, e quanto mais fundo vamos, menos conhecemos. Temos assim muito ainda a caminhar, temos que aprender a mergulhar, e para piorar, sendo esta uma ilha vulcânica em formação, está constantemente em crescimento, com solo ainda recente, sujeita a fortes transformações de seu contorno litorâneo, e a interface ilha/mar é por si só instável, além de termos que aprender que certos seres vivem nestes dois ambientes, que na verdade é apenas um, interagindo diretamente, como pássaros, anfíbios e mesmo seres marinhos que retornam aos rios e praias para procriação, fazendo desta interação algo muito dinâmico e que necessita cuidado, atenção e foco, para aos poucos irmos crescendo esta ilha de nosso conhecimento. Outro detalhe importante, e que corrobora para a dificuldade é que nosso cérebro é por princípio plástico, e que a forma como opera (funcionalmente, não bioquimicamente) pode também ser plástica e/ou diferente em cada um de nós. O genoma, que permite nosso cérebro, deve ser entendido muito mais como uma receita do que como uma planta. O genoma não é uma planta, como a de engenharia, pois que em uma planta, cada pedaço, cada detalhe da planta corresponde “bi univocamente”, um para um, com a realidade do construído, com cada parte ou detalhe do produto final. Se olhamos uma planta entendemos o produto, e se olhamos o produto sabemos nos achar na planta. O cérebro e o genoma não são assim, aliás nenhuma parte de nosso corpo é assim correspondida pelo genoma, por isto ele seria mais claramente entendido como uma espécie de receita, por exemplo, ao vermos ou saborearmos um bolo delicioso, não sabemos exatamente a relação de cada pedaço, de cada porção deste bolo com uma linha da receita em si, desta forma a receita, com os ingredientes e a forma de preparo, e mais as interferências intencionais ou não externas fazem o bolo, todo o bolo, e não exatamente cada linha da receita se representaria em um pedaço do bolo. Em nenhum lugar do genoma temos a fórmula para o pensar, para a consciência, para o sentir, o emocionar e o se sentir um ser.

Entendo assim, que o pensar pode e deve ser motivado, provocado, e “ensinado”, e que pais e responsáveis, ou mesmo toda a sociedade, se espera realmente seres pensantes, é responsável por esta motivação e este desenvolvimento. Os responsáveis, em especial, deveriam ser os mais interessados neste tocante, e assim são eles, pelo menos por uma boa parte do desenvolvimento de um ser, os maiores responsáveis por lapidar, ou dar força, por aprofundar em cada ser a curiosidade, a revolta necessária à procurar respostas, a desenvolver e amadurecer o processo de pensar, e não o da catequese. As escolas, como um todo, podem participar deste processo, mas é um processo muito mais de educação do que de instrução, cabendo assim muito mais aos pais e responsáveis do que a escola. Exigir das escolas isto como obrigação é fugir da responsabilidade que é prioritariamente dos pais e dos responsáveis. A escola cabe sociabilizar e instruir, e tanto um como outro são parte essenciais para um bem pensar, pois que pensar independente do mundo social e natural, ou pensar sem domínio de um conhecer, de um saber e de uma instrução, com certeza nos levará a pensar mal. Pensar bem necessita estar fortemente vinculado a verdades, conhecimento, a saberes, evidências, estes sim como função primordial de cada escola. É claro que um bom professor saberá provocar o pensamento enquanto ensina, forçará a que o aprendizado seja uma relação dual, coletiva, professor, aluno, turma, sociedade, e as disciplinas devem buscar o máximo de interdisciplinaridade possível, e devem estar fortemente atreladas a realidade do dia a dia, não apenas a realidade daquele nicho pequeno de pessoas, mas a realidade social coletiva e inerente a todo a corpo social em que estamos imersos, gostemos ou não, aceitemos ou não, conheçamos ou não. Este é para mim um dos diferenciais fortes, não únicos, pois que o saber em si é vital, mas dar liberdade com responsabilidade para que seu alunato participe coletivamente, por grêmios, por diretórios estudantis, ou por quaisquer outros meios de movimentos, discutindo-os e esmiuçando-os, com aquelas básicas perguntas que todo pai ou responsável deveria provocar em seus filhos que fazem a real diferença: O Que é? Para que? Como (uma das mais importantes)?  Por que? Se envolve parte social, política ou coletiva, devem ser adicionadas: Que interesses estão em jogo? A quem interessa? Quem não tem interesse? Como afeta a todos? Quais os valores envolvidos? E outras mais. Isto é função dos pais e responsáveis, sendo também, mas em menor escala responsabilidade de toda a sociedade, das mídias e das escolas. Um jovem que não possui esta capacidade, que não carrega em si um que de revolta, um forte desejo de independência e de certa transgressão, para mim está parcialmente perdido, pois que entendo ser nesta idade que é natural esta força da transgressão. Se quando jovem, ela já não a possui, tenderá a ser mais um adulto catequizado, tenderá a ser mais um adulto seguidor e não transformador. É este jovem que o sistema quer, inerte, passivo, e os pais são basicamente culpados por cercearem a ousadia, por destruírem a curiosidade, por não provocarem a busca, a pesquisa, as evidências. Saber pensar passa um pouco por esta coragem de experimentar e pensar enquanto age e experimenta. Somos responsáveis por não disseminar a história real, por repetir e divulgar a história dos vencedores, cantada e decantada pelas mídias, pelas revistas de “desopinião”, pelas estruturas conservadoras, pelos livros selecionados exatamente por quem mais interessa que a história reforçada seja a dos vencedores, que são os que detêm o poder econômico. Em nosso país, e creio na maioria dos que possuem forte ascensão do poder econômico, não é a política quem dita o econômico, mas sim são os detentores do poder econômico quem ditam a política. Culpar as escolas como responsáveis por seres não pensantes, ou mal pensantes, é fugir da responsabilidade individual que temos pelos nossos filhos por nossos dependentes. 

Pensar! Todos nós, em qualquer lugar deste “mundão”, desde que com uma saúde mínima mental, somos capazes de pensar. Pensar é uma funcionalidade natural de nosso cérebro físico/material. Pode até ser, como creio, que pensar não tenha sido “inicialmente” algo natural ao surgimento e aos primeiros passos do cérebro. Pode ser que o pensar seja algum efeito colateral, alguma decorrência não esperada, que emergiu naturalmente, decorrente da “evolução” da complexidade de um circuito neural que se mostrou cada vez mais poderoso e criativo. Circuito este que deve ter tido início como algo essencialmente focado a ser uma excelente ferramenta e funcionalidade de apoio e suporte à vida e a nossa sobrevivência. Uma circuitaria, que como entendo, surgiu para dar enorme ganho tanto de eficácia quanto de eficiência para nossa sobrevivência, para a regulação de nosso organismo, para sustentação as nossas operações vitais. Este suporte a vida que seria sem o cérebro realizado meramente por sinalização-interação bioquímica, que assim necessitariam de um “tempo de resposta” lento, passa a ser “controlado/regulado” em tempo real, por sensores que trocam informações continuamente, e praticamente instantaneamente que sem este ferramental necessitariam de muito mais tempo entre sinalização e resposta. O cérebro surge e é selecionado, para entre outras ações de sustentação a vida, agilizar esta troca de sinais e informações entre órgãos distintos de nosso corpo. É fácil perceber os sensores colocados externamente, os olhos, os ouvidos, as narinas e etc, mas internamente, nosso corpo é também repleto de sensores que ligados em circuito ao cérebro, recebe, processa e retorna ações, muitas vezes a outros sensores em outros órgãos ou locais. O pensar surge, para mim, como derivação de funcionalidade, que é facilmente percebida como de ganho para a sobrevivência e para permitir descendentes, em decorrência do aumento evolutivo do poder de processamento deste circuito neural maravilhoso, que aos poucos, foi ganhando funcionalidades extras, até talvez a mais recente, a da capacidade de percepção de ser ou ter alguma consciência. O pensar é tão natural, como são as funcionalidades orgânicas, e as aprendidas durante nosso crescimento, desta forma creio ser vital a responsabilidade por provocar e motivar a capacidade de pensar, criar, usar, duvidar, buscar, analisar e estudar. Por este raciocínio, somos responsáveis por buscar que aprendamos a pensar bem, mesmo que não acredite que exista um método único ou infalível para pensar bem, mas pensar bem com certeza é ter a coragem de pensar livre de preconceitos, sabedor de que jamais independente de todos os conceitos, contudo abertos a trocar estes conceitos sempre e cada vez que evidências nos sejam mostradas que justifiquem estas mudanças. Eu não sei se sou um bom pensador, mas uma coisa eu acredito, que pelo menos eu tento, eu ouso, eu busco ir fundo, eu tento ver através de diferentes perspectivas, mas posso ser tão mal pensador quanto aqueles que eu penso serem um tanto quanto limitados no ato de pensar.

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