Filhos
Não importa o quanto conscientemente saiba que meus filhos são do mundo, que nasceram para terem vidas próprias, que a vida é o destino natural deles, algo de mim, egoisticamente talvez, gostaria de tê-los sob minha proteção por todo o sempre que me fosse possível viver. O meu amor por eles, e o fato de ter me responsabilizado pelo preparo e pela educação deles, não me dá posse alguma sobre eles, não obstante algum desejo egoísta de que eles sempre estivessem por perto, entretanto meus filhos, são e serão meus filhos, sendo em verdade filhos da ânsia dinâmica do viver, esperando apenas ter conseguido ser um pai a altura da humanidade que eles precisam desabrochar. Uma coisa é certa, logo-logo chegará o dia em que eles alçarão voo frente ao desafiante mundo das suas próprias vidas, certamente, jornada esta que se iniciou em pleno desenvolvimento juvenil, e que tende a acontecer definitivamente em muito breve. Se acertei na educação, se consegui ser responsavelmente um tutor que eles mereceram no aprendizado e no respeito ao que é viver, eles alçarão este voo, saberão caminhar humanamente e com certeza, de alguma forma, carregarão em suas mentes a lembrança de pais que se doaram pela formação deles. O meu coração bate trêmulo de ansiedade pela possibilidade de que não os tenha preparado bem, mas independentemente de qualquer medo, a vida lhes grita para nela se lançarem, e eles terão de caminhar para ela, eles já caminham para ela.
Sei que nada fiz esperando qualquer tipo de retorno, não investi em meus filhos para o meu futuro, investi nos meus filhos pelo presente vindouro de cada um deles, unicamente deles, deles para com o mundo, deles para com a sociedade deste mundo, deles para poderem ser elos de transformação desta sociedade, por isto não deveria temer que de mim se esqueçam, pois isto é parte do exercício de viver. Sei que não os terei para sempre, ou que os terei como parte das memórias e dos sentimentos que sou. Suas vidas terão trilhas e caminhos que sequer posso imaginar. Preocupa-me sim, o fato de que eles, na ânsia necessária do viver, do experimentar, e do realizar suas próprias jornadas de vida, possam esquecer-se de suas humanidades, possam se perder do verdadeiro amor, e possam assim se distanciar de alguma felicidade real, verdadeira e reconfortante, daquela felicidade que recarregará suas energias sempre que tropeços cheguem, ou sempre que algumas dificuldades, ou mesmo alguma dor cruzar os seus caminhos, daquela felicidade capaz de reconfortar, recompor e dignificar suas existências.
Sofro pela certa incapacidade de protegê-los da própria vida: isto é viver. Isto é realizarem suas vidas.
Tenho a certeza que ao meu modo, por mais perdido que o futuro possa me colocar, mesmo que seja atropelado por dificuldades, enquanto existir alguma consciência de meu ser, ou de meus seres, e alguma saúde mental, existirá em mim um amor sincero por eles.
Sei que sou muitos, e sei que sou complexo, mas uma coisa eu creio sinceramente, sou incapaz de conhecer em essência todos os seres que me compõem, mas todos eles, sem exceção, amam firmemente meus filhos, talvez por que seja biológico, talvez por que me comprometi de corpo e alma mental a prepara-los, talvez por que decidi construir por eles algo muito maior do que uma simples relação de pais e filhos.
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