Eu me contradigo
Eu me contradigo? Que bom, sou humano, sou complexo, sou múltiplo, sou caminhante. Sou eu sendo muitos, e nos muitos que sou, sou único, pois que os muitos que sou me fazem seu eu. Se eu me contradigo não é sinal, necessariamente, de fraqueza, indecisão ou incompetência. Se eu me contradigo, pode ser porque caminhe. O problema, se existe, e quando existe, está no como e no porque me contradigo. Se por procura, por busca, por ousadia de caminhar na busca de conhecimentos, por razões críticas ou por racionalidade, que bom. Se me contradigo por induções, por dúvidas (não que ter dúvidas seja algo errado, mas tê-las e não correr atrás de alguma possível verdade, e ficar me contradizendo simplesmente porque hoje acho isto e amanhã acho aquilo, e depois de amanhã volto achar isto é que não deve ser a melhor alternativa), por fraqueza de sustentar o que acho certo, ou por medo de manter o que acredito, por conveniência ou por interesses pessoais ou corporativos, que mal.
Nosso cérebro é plástico, nossa mente assim também o é, pois que reflexo da emergência funcional deste mesmo cérebro, sou já agora, só porque me coloquei a pensar e a escrever este texto, já um pouco diferente do que era no exato instante antes de iniciar este mesmo texto, sou plástico no consciente, mas sou muito mais plástico ainda no inconsciente, não porque seja necessariamente melhor, mas porque é a inconsciência, necessariamente, muito maior que a consciência, e assim muito mais suscetível a plasticidade do que eu sou e do que eu estou, pois que sou muito mais o inconsciente que me faz ser e estar.
Escrevo pelo prazer de ser eu mesmo, naquele exato momento, e não o que fui antes ou serei amanhã. Escrevo porque não posso falar a muitos. Escrevo para provocar, não somente os outros mas principalmente a mim mesmo, na busca ousada e comprometida pela derrota do ceticismo que me pôs em busca, que me movimentou pela curiosidade de chegar a algum lugar. Escrevo, não porque seja dono da verdade, mas como forma de organizar o que penso, o que acredito, e de me fazer transparente à mim mesmo (não no sentido de invisível, mas no sentido de permitir que me conheçam sempre e cada vez mais um pouco mais de mim) e aos que tentam, poucos que sejam, me entender. Se o que escrevo fez pelo menos um, além de mim, repensar seus conceitos, mesmo que não os mude, já atingi algum objetivo. Escrevo por que amo escrever, escrevo por que sou um revoltado, mas não me escondo por detrás de palavras, não sucumbo a tentação de acreditar que basta escrever, preciso falar, preciso gritar, preciso agir, preciso demonstrar minha revolta também por atitudes e comportamento, preciso ser aventureiro e vanguardista na luta pelo que que creio, preciso me expor de peito aberto. Escrevo porque se não o fizer, me sinto incompleto e insensível pelo que aqui está de situação (des)-social, de (des)-verdades, de falsas humanidade e de omissão. Escrevo enfim porque me faz bem, me acalma um pouco, me faz, mesmo que irrealmente, um pouco mais útil pelo que entendo seja minha jornada por aqui, já que esta será única, sem direito a segunda chamada, recuperação ou repetição de anos, pois que do nada de ser que sempre fui, realizo agora, e somente agora, um breve momento de existência, e logo-logo voltarei para a eternidade existencial de nada mais ser, e tenho como razão de viver preparar meus filhos e ajudar com coragem e prioridade os que mais necessitam de ajuda, os miseráveis, os pobres, os enganados, os catequizados, preciso abrir a experiência de todos a beleza de algum ceticismo, a beleza da curiosidade, a beleza de um viver crítico e racional, a um viver social coletivo, mesmo que eu necessite por isto sucumbir, para que outros possam crescer como humanos, como seres sociais, nunca como heróis ou salvadores, mas sim como lutadores e engrenagem desta transformação. Por isto escrevo, posso estar totalmente errado, posso não escrever bonito, posso não atingir uma escrita culta, mas que se dane a cultura formal que age apenas como mais um “segregador” de povos, os cultos e os incultos, escrevo por que se não o fizesse, me sentiria muito menos eu, muito menos parte do todo....
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