Algumas decisões são difíceis demais


Algumas decisões são difíceis demais, algumas beiram os limites extremos de nossos valores éticos ou mesmo de nossa capacidade de suportar a indecisão, provocando-nos não somente acerca de nossos princípios morais e éticos, mas de nossa capacidade de exaustão física e mental por evitar toma-las.


Muitas vezes passamos a vida defendendo algo, e de uma hora para outra somos arrastados para situações dolorosas e sofridas em que jamais gostaríamos de estar, onde tomar uma simples decisão pode por a prova nossos ideais, mas não toma-las pode nos destruir mental e psicologicamente, situação desgastante por si só, mas momento de ser algo racional, até onde alguma racionalidade possa ser possível em um espírito sofrido, mas busca-la é mister, nada fácil, mas necessária. A vida, a defesa da vida, é uma delas. Defensor da vida, podemos ser pinçados a situações onde somos colocados contra a parede, espremidos pelo que defendemos, contra o que entendemos ser melhor naquele instante. Amante do direito à vida, podemos ser abandonados à dor de ter de decidir por tentar prolonga-la a qualquer custo, colocada frontalmente contrária ao próprio sofrimento do paciente, onde toda qualidade de vida é desprezada frente ao único desejo de prolongar a vida de quem amamos, como uma espécie de egoísmo pessoal contra uma realidade de sofrimento e de falta de perspectiva total de melhora, outras vezes colocada frente à incapacidade financeira de sustentar uma busca já desacreditada pela medicina.

Pessoalmente, de forma crítica e consciente, sou a favor da legalização da eutanásia, mas uma coisa é entender intelectualmente o direito a por fim a algum sofrimento desmedido e sem perspectiva nenhuma de melhora, outra coisa é quando emocionalmente envolvido, temos de tomar esta decisão. Assim a clareza da certeza racional se perde em dúvidas e temores, a transparência de uma certeza se veste em névoa, e a decisão que parecia fácil arruína-se em profunda dor, e turva nosso ser frente a simples questão: Quando é chegado o momento limite desta decisão? Quando chegamos ao extremo? Existe este extremo? Quando será que o limite do sofrimento já extrapola a busca por alguma sobrevida? Quando será que a dignidade do viver já foi superada pela dor, pelo desespero e pela falta de dignidade do viver? Quando será que a vida passa a ser sofrimento extremo e nenhuma mais qualidade de vida há? Quando será que o endividamento financeiro fica insuportável frente a quase nenhuma chance de alguma sobrevida útil, digna e com mínima qualidade? Normalmente, sempre somos tentados a acreditar em alguma esperança de melhora e recuperação. Doenças terminais com exacerbado sofrimento do paciente. Qual seria o limite válido ou aceitável para se continuar tentando? Coma profundo, qual seria o tempo aceitável para tentar manter uma sobrevivência forçada? E quando o problema passa a ser o custo? Situação dolorosa para quem se encontra nestas posições, sendo provocado a decidir. Quão éticas ou antiéticas seriam estas decisões? Quem poderia afirmar a justiça ou injustiça de qualquer destas decisões? E se trocássemos um ser humano nesta situação por um animal, em especial um animal com que dividimos nossas vidas por muitos anos? Mudaria algo? Mudaria muito? Pode ser que para alguns, quando falamos de animais, torne-se mais fácil de decidir, pois talvez nunca tenham verdadeiramente amado um não humano, mas para aqueles que sincera e genuinamente viveram alguma comunhão compromissada com um deles, qualquer um deles, sabe como eles são importantes, não somente porque são seres vivos, com o mesmo mistério da vida, com aquele salto de vida que da química fez-se biologia, mas também por terem sido nossos amigos, parceiros e companheiros, muitas vezes mais do que muitos parentes ou conhecidos. Como deve sofrer alguém nesta condição? Como culpar sua escolha, sua decisão, quando exposto a algum dos fatos acima?

Algumas decisões são muito difíceis, ainda bem que tendem a ser raras. Alguns jamais se recuperam por completo quando as tomam...

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